“O que é nascido da carne é carne; e o que é nascido do Espírito é espírito.” (João 3.6)
Nosso Senhor nos dá em poucas palavras qual é a condição real da natureza humana, ao afirmar que “o que é nascido da carne, é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito.”
Ele se refere a dois tipos de nascimentos distintos por reprodução. O primeiro em relação à carne, ou ao que é natural, que somente pode gerar algo à sua própria semelhança, ou seja, natural. O segundo em relação ao Espírito Santo que gera nascimentos sobrenaturais, ou seja, espirituais.
Apesar de existir aquilo que poderíamos chamar de algo assombroso relativamente à formação de um ser natural como o humano, que é gerado a partir de uma única célula formada da união de um espermatozoide com um óvulo, e que por reproduções sucessivas chega a formar o complexo de órgãos, sistemas, processos físico-químicos, e tudo o mais que mantém a vida em funcionamento, com comandos involuntários criados e programados por Deus de modo sobrenatural, para a constituição plena das funções do ser humano, todavia, ele dispôs este processo natural de tal forma, que toda geração natural será processada espontaneamente a partir dos princípios que ele estabeleceu previamente para tal propósito.
Daí nosso Senhor afirmar que o que é nascido da carne é carne.
Entretanto, quanto ao nascimento espiritual operado pelo Espírito Santo, nestes que chegaram à existência através da geração natural, este é de outro caráter, porque não pode ocorrer espontaneamente pela vontade e controle do homem, como o primeiro, e nem a nova vida espiritual gerada pode ser mantida por processos naturais, senão somente pelas operações sobrenaturais do Espírito Santo.
No contexto desta passagem de João 3.6 nós encontramos o diálogo de Jesus com Nicodemos, no qual ele destacou a necessidade de um novo nascimento do alto, do Espírito Santo, para que possamos ver o reino de Deus. Assim ele apontou que permanecemos alijados da vida espiritual de Deus, que é espírito, enquanto não nascemos de novo do Espírito Santo.
Nosso Senhor também ensinou no contexto desta passagem que este novo nascimento somente pode ser obtido pela fé nele.
Daí se dizer nas Escrituras que se alguém está em Cristo é uma nova criatura, ou novo homem, o que é designado pelo Senhor no texto de João 3.6 simplesmente pela palavra espírito. Esta nova criatura gerada pelo Espírito Santo não é algo de outra substância que é acrescentada ao espírito da pessoa que nasceu de novo na conversão a Cristo.
Fala-se na Escritura de algo que é colocado, como uma nova disposição, como vemos em Col 4.10.
Embora seja algo distinto do espírito do homem; no entanto, é uma coisa mais intimamente inerente a ele, e que é mais estreitamente unida a ele, e que nos renova, Ef 4.23; Sl 51.10. E este trabalho de renovação é feito no homem interior, ou seja, no mais profundo do nosso ser, em nossas disposições interiores que nos definem como a pessoa que realmente deveríamos ser, conforme projetado por Deus, e não no homem exterior, que se corrompe com o avançar do tempo, ou mesmo em manifestações superficiais de nossas faculdades que se revelam em conversações e ações vazias e infrutíferas relativamente aos desígnios de Deus.
É impossível para a mente comum conceber que haja uma outra dimensão de vida (a espiritual que nos vem do alto) além desta já tão complexa vida natural com todo o seu aparato de possibilidades de desenvolvimento de habilidades e conhecimentos, conforme foi programado por Deus, e daí não serem poucos os que negligenciam esta necessidade vital de um novo nascimento do espírito, por não crerem que seja de fato necessário ou mesmo possível, uma vez que a própria vida natural é assim tão cheia de mistérios que o homem vem desvendando ao longo das eras.
Mas como Deus não projetou o que é natural para a eternidade, senão somente o que é espiritual, e que possua o mesmo caráter da divindade, em seus atributos e virtudes espirituais, então, torna-se crucial atingir este propósito eterno, uma vez que tudo o que é natural se desfaz pelo uso e com o tempo.
A vida natural por mais plena e pura que fosse, ainda assim, não poderia adentrar a eternidade, porque isto é concedido somente ao que é espiritual. Espiritual, não simplesmente por possuirmos um espírito, porque disto todas as pessoas são dotadas, mas espiritual no sentido de possuir a vida que é produzida pelo Espírito Santo naqueles que têm a Cristo.
Deve ser levado em conta, sobretudo, que Deus não pode habitar senão naqueles que são assim nascidos de novo do Espírito Santo, porque é nestes que há o consentimento voluntário do trabalho que Ele operará da transformação deles à sua própria imagem e semelhança. Daí o apóstolo chamar a isto de coparticipação da natureza divina, 2 Pe 1.4, indicando que esta harmoniosa cooperação da vontade do homem, submetendo-se à vontade de Deus, uma vez que nele agora habita esta nova disposição espiritual que é nele produzida pela habitação do Espírito Santo.
Há necessidade desta justa cooperação porque na criatura natural tudo está disposto para crescer espontaneamente sem a influência direta do exercício da nossa vontade para o seu funcionamento e crescimento. Mas tal já não sucede em relação à nova criatura onde tudo exige esforço, diligência, escolha, segundo o querer e o efetuar de Deus. Ou seja, a nova criação espiritual demanda um contínuo andar no Espírito Santo e obediência às ordenanças de Deus constantes de Sua Palavra. Sem isto não há crescimento e nem a manutenção das graças recebidas por meio da fé em Cristo.
A criatura natural pode viver sem Deus no mundo. Mas a nova criatura não somente existe sem Deus, como também não pode subsistir afastada dele.
Daí o apóstolo ter afirmado: “já não vivo eu, mas Cristo vive em mim” Gál 2.20. A nova criatura garante a permanente presença diante de Deus, porque é nascida do Espírito, e assim, não pode morrer, e nunca deixará de viver aquela vida sobrenatural e superior que se encontra em Jesus Cristo.
Esta nova vida foi gerada da semente incorruptível, que não comete pecado, e que foi colocada por Deus na alma de todo o que crê em Jesus, 1 João 3.6. É pela germinação e crescimento progressivo desta semente que o pecado será mortificado mais e mais para que possamos produzir os frutos espirituais de justiça esperados por Deus, Rom 8.6-14.
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