04 abril 2012

Ideias são como sementes – Vida comunitária


Ideias são como sementes – Vida comunitária

Viver em comunidade é uma poderosa ideia que somente poderia ter sido gestada no coração e na mente de um Deus cuja essência é comunitária.
Comecemos pelo óbvio: uma das mais poderosas ferramentas do nosso tempo são as redes sociais. Através do Facebook, pessoas desconhecidas se conectam, amigos de outros tempos se reencontram, imagens e perfis são construídos ou destruídos em questão de alguns toques. Seu poder se estende para além da mera conexão entre pessoas: a mobilização virtual já se mostrou eficaz, inclusive, para ajudar a derrubar governos ditatoriais, como se viu recentemente na chamada Primavera Árabe. A força dessas redes está justamente no fato de que elas criam comunidades – e, quando as pessoas experimentam o senso de comunidade, por mais frágil que seja, aí há um incrível poder.
Viver em comunidade foi uma das mais poderosas ideias que influenciaram gerações de cristãos. Especialmente nos primeiros séculos, a comunidade tinha um lugar central. Havia, por exemplo, as comunidades dos desertos. Homens e mulheres migraram para as regiões desérticas em busca de uma relação mais profunda com Deus, entendendo que a vida na cidade estava condenada à superficialidade. Paradoxalmente, eles se isolaram para viver juntos. Então, floresceram comunidades poderosíssimas do ponto de vista espiritual. Ali, as relações não eram baseadas em poder ou dominação, mas em serviço a Deus e uns aos outros. As portas estavam abertas para todos, mas não era fácil entrar: era preciso que cada interessado provasse um real interesse pelo pertencimento. Desejos superficiais ou impulsos passageiros não eram suficientes, já que a vida comunitária exigia humildade, submissão, disciplina e, sobretudo, estabilidade. Não se rompiam os laços na primeira desavença, e a perseverança os levava a continuar caminhando juntos, apesar dos obstáculos relacionais.
Nas comunidades do deserto, os vínculos eram mais importantes do que número. A qualidade dos relacionamentos era uma marca fundamental daquela maneira de existir. A maior força daqueles grupos estava no fato de que as pessoas aderiam a elas por causa de um ideal. Novos membros somente eram aceitos após demonstrar resoluto compromisso em, junto com outros, construir o que se sonhava. Mas qual era esse ideal? Eles desejavam que a comunidade terrestre pudesse ser uma antecipação da comunidade celestial. Queriam relacionamentos, um modo de viver  do qual se pudesse dizer “assim na terra, como no céu”. Utopia? Talvez; mas a lição desses sonhadores do deserto é que o poder de uma comunidade está no seu ideal e na sua capacidade de atrair pessoas seduzidas por realizá-lo. A preocupação não era com a atração de novos adeptos, mas com a certeza de que quem entrasse não queria servir-se da comunidade, mas sim, construí-la à luz do sonho que dentro dela se carregava.
Naquele contexto, as relações comunitárias eram profundamente transformadoras. Mudanças no caráter, nos valores e até  no jeito de falar eram consequência natural daquele modo de vida. Quanto mais alguém ia se aprofundando nos relacionamentos e nas dinâmicas comunitárias, mais se ia sendo moldado, deixando de ser um “eu” isolado, obsessivamente preocupado em satisfazer-se, para tornar-se parte de um todo, no qual os interesses pessoais eram atingidos pela construção do bem comum. O resultado final é que cada pessoa se via parte de um todo, comungando de um ideal comum.
Quem é capaz de negar que comunidades com essas características podem mudar o mundo? Quem não gostaria de fazer parte de uma experiência comunitária assim? Não terá sido este tipo de comunidade que Jesus tinha em mente quando disse que as portas do inferno não seriam capazes de conter o poder de sua Igreja? Não seriam comunidades assim o grande antídoto divino para curar nosso essencial pecado humano de viver somente para nós mesmos? E não é o Deus cristão essencialmente relacional, vivendo uma misteriosa comunidade eterna na qual Pai, Filho e Espirito Santo vivem em inquebrável harmonia?
Comunidades alicerçadas neste Deus relacional são capazes de iluminar este mundo tão carente de luz. Sim, viver em comunidade é uma poderosa ideia que somente poderia ter sido gestada no coração e na mente de um Deus cuja essência é comunitária. Aqueles que ousarem despir-se de si mesmo e se revestirem de vestes comunitárias, como fizeram alguns dos nossos antepassados cristãos, verão o poder transformador que emerge de um grupo embalado por um maravilhoso ideal.