A palavra fé parece assumir dois sentidos para os cristãos. […] No primeiro, ela significa simplesmente crença — aceitar ou considerar verdadeiras as doutrinas do cristianismo. Isso não tem nada de complicado. Porém, o que intriga as pessoas — ou pelo menos é o que costumava me intrigar — é o fato de que os cristãos se referem à fé, nesse sentido, como uma virtude. Eu costumava me perguntar o que podia haver de virtuoso nisso — o que tem de moral ou amoral em acreditar ou não em certo conjunto de afirmações? Eu costumava dizer que uma pessoa em sã consciência não poderia aceitar ou rejeitar qualquer afirmativa só porque desejava ou não aceitá-la, e sim porque as evidências lhe pareciam boas ou más. […]
Bem, acho que continuo adepto a essa visão. No entanto, o que eu não conseguia ver na época — e o que muitas pessoas continuam não enxergando — é o seguinte: eu supunha que, uma vez que a mente humana aceita algo como verdadeiro, ela continua acreditando nisso até que surja um bom motivo para reconsiderar tudo. Eu estava supondo que a mente humana é completamente regida pela razão. Mas isso não é verdade. Por exemplo, minha mente está perfeitamente convencida, por boas evidências, de que os anestésicos não me sufocam e que os cirurgiões bem treinados não começam a me operar até que eu esteja totalmente anestesiado. Mas isso não impede que, depois que eles tiverem me posto na mesa, e colocado aquela máscara horrível no meu rosto, eu seja tomado por um pânico infantil. Eu começo a imaginar que posso morrer sufocado e fico com medo de eles começarem a me cortar antes de eu estar preparado. Em outras palavras, eu perco minha fé nos anestésicos. Porém, não é minha razão que está minando minha fé; pelo contrário, minha fé está baseada na razão. São minhas emoções e minha imaginação. A batalha é entre fé e razão, de um lado, e emoções e imaginação, do outro.
Retirado de "UM ANO COM C S LEWIS"
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