Esta palavra deriva-se de in spiro, "soprar para dentro, insuflar", aplicando-se na Escritura não só a Deus, como Autor da inteligência do homem (Jó 32.8), mas também à própria Escritura, como "inspirada por Deus" (2Tm 3.16). Nesta última passagem claramente se acha designada uma certa ação de Deus, com o fim de transmitir ao homem os Seus pensamentos. Ainda que se fale primeiramente de inspiração no Antigo Testamento, pode o termo retamente aplicar-se ao Novo Testamento, como sendo este livro considerado também como Escritura. A palavra, significando "sopro de Deus", indica aquela primária e fundamental qualidade que dá à Escritura o seu caráter de autoridade sobre a vida espiritual, e torna as suas lições proveitosas nos vários aspectos da necessidade humana.
O que é a inspiração, pode melhor inferir-se da própria reivindicação da Escritura. Os profetas do Antigo Testamento afirmam falar segundo a mensagem que Deus lhes deu. O Novo Testamento requer para o Antigo Testamento esta qualidade de autoridade divina. De harmonia com isto, fala-se em toda parte da Escritura, como sendo a "Palavra de Deus". Tais designações como "as Escrituras" e "os oráculos de Deus" (Rm 3.2). havendo também frases como estas - "esta escrito" - claramente mostram a sua proveniência divina. Além disso, são atribuídas as palavras da Escritura a Deus como seu Autor (Mt 1.22; At 13.34), ou ao Espírito Santo (At 1.16; Hb 3.7); e a respeito dos escritores se diz que eles falavam pelo Espírito Santo (Mt 2.15). E deste modo as própria palavras da Escritura são considerada de autoridade divina (Jo 10.34,35; Gl 34.16), e as suas doutrinas são designadas para a direção espiritual e temporal da humanidade em todos os tempos (Rm 15.4; 2Tm 3.16). O apóstolo Paulo reclama para as suas palavras uma autoridade igual à do Antigo Testamento como vindas de Deus; e semelhante coloca a sua mensagem ao nível das mais antigas Escrituras.
A garantia de ter esta doutrina da Sagrada Escrituras autoridade divina está no ensinamento a respeito do ES, que foi prometido aos discípulos de Cristo como seu Mestre e Guia (Jo 14.26; 16.13).
É melhor usar o termo "revelação" quando se tratar, propriamente, da matéria da mensagem, e a palavra "inspiração" quando quisermos falar do método pelo qual foi revelada a mensagem. Por inspiração da Escritura nós compreendemos a comunicação da verdade divina, que de certo modo é única em grau e qualidade. Como os apóstolos eram inspirados para ensinar de viva voz, não podemos pensar que não tivessem sido inspirados quando tinham de escrever. Por conseqüência, podemos considerar a inspiração como especial dom do Espírito Santo, pelo qual os profetas do Antigo Testamento, e os apóstolos e seus companheiros no Novo Testamento, transmitiram a revelação de Deus, como eles a receberam.
É claro o fato de uma única inspiração das Escrituras. Mas até onde se estende esta inspiração? Revelação é a manifestação dos pensamentos de Deus para a direção da vida do homem. Se a vontade divina tem de ser conhecida, e transmitida às gerações, deve ser corporificada em palavras; e para se estar certo dos pensamentos, é preciso que estejamos certos das palavras. A inspiração deve, portanto, estender-se à linguagem.
Em 2Pe 1.21, os homens, e em 2Tm 3.16, a Escritura, diz-se serem inspirados; na verdade, não poderíamos ficar satisfeitos, considerando inspirados os homens, e não os seus escritos, porque a inspiração pessoal deve, necessariamente, exprimir-se pela escrita, se é certo que tem de perpetuar-se. A vida estender-se por toda parte do corpo, e não podemos realmente fazer distinção entre o espírito e a forma, entre a substância e o molde.
Todavia, a expressão "inspiração verbal" precisa ser cuidadosamente determinada contra qualquer noção errônea. A possibilidade de haver má compreensão faz que muitos cristãos prefiram a frase "inspiração plenária". A inspiração verbal não significa um ditado mecânico, como se os escritores fossem instrumentos meramente passivos: ditar não é inspirar. A inspiração verbal estabelece até que ponto vai a inspiração, estendendo-se tanto à forma como à substância. Diz-nos o "que é", e não "como é", não nos sendo explicado o método da operação do Espírito Santo, mas somente nos é dado conhecer o resultado. Deus fez uso das características natural de cada escritor, e por um ato especial do Espírito Santo, habilitou-os a comunicar ao homem, por meio da escrita, a Sua divina vontade. Observa-se esta associação do divino e do humano nas passagens como estas: Mt 1.22; 2.15; At 1.16; 3.18; 4.25. A operação do Espírito Santo junta-se com a atividade mental do escritor, operando por meio dele e guiando-o. Ainda que não saibamos explicar o modo de tal operação, conhecemos os seus resultados. Certamente esta maneira de ver a respeito da inspiração refere-se somente aos escritos, como eles saíram das mãos dos escritores originais. Os manuscritos originais não foram preservados e por isso precisamos do auxílio de um minucioso criticismo textual de tal maneira que possamos aproximar-nos tanto quanto possível do tempo e das circunstância dos autógrafos.
Esta maneira de compreender a inspiração pode ser justificada pelas seguintes considerações:
a) O uso atual da Bíblia, na vida e obra da Igreja cristã, sendo acentuada a sua autoridade no ensinamento verbal.
b) Uma ponderada e sábia exegese em todos os tempos mas especialmente em nossos dias.
c) O recurso à Bíblia em todos os assuntos de controvérsia.
d) A crença sobre este ponto nos tempos apostólicos e sub-apostólicos.
e) O uso do Antigo Testamento pelos escritores do Novo Testamento, notando-se 284 citações, e frases como "está escrito".
f) Jesus Cristo acha apoio no Novo Testamento para suas considerações, como em Jo 10.30-36.
g) Os profetas e os apóstolos consideravam-se homens inspirados (2Sm 23.2; Jr 36.4-8; 1Co 2.13; 14.37).
É impossível limitar a inspiração à doutrina, e considerar a história como sujeita a circunstâncias comuns, pois que doutrina e história estão unidas de tal modo que não podem separar-se. A própria revelação de Cristo é a de uma pessoa histórica, sendo inseparável os fatos e as doutrinas que lhe dizem respeito. E diz o Novo Testamento que a história do Antigo Testamento é inspirada e escrita pra nossa instrução (Rm 4.23,24; 15.4; 1Co 10.6,11).
Sendo a Bíblia uma autoridade para nós, assim a devemos considerar, seja qual tenha sido o método da inspiração: porquanto o valor da autoridade realmente independente de todas as particularidades sobre o modo como foi inspirada. É auxiliado o estudo da inspiração pela analogia entre o Verbo encarnado e a Palavra escrita: ambos são divinos, e também são humanos, embora, em cada caso, é impossível dizer onde termina o divino e começa o humano. Ambos os elementos ali estão, reais e inseparáveis, de maneira que, quer se trate de Cristo ou da Bíblia, podemos dizer que tudo é perfeitamente humano e tudo é absolutamente divino.
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