“E o que a si mesmo se exaltar será humilhado; e o que a si mesmo se humilhar será exaltado” (Mateus 23:12).
O homem tem uma inclinação natural (do pecado) para a autoexaltação. Em certas épocas, isso já foi considerado um vício, mas hoje é exaltado como virtude. Nas entrevistas de jogadores, por exemplo, percebemos que a autoexaltação é uma característica não somente comum entre eles, como também fomentada pela mídia. O estranho é ser humilde. Quanto mais o entrevistado se exalta, mais valor parece ter para os clubes. O mesmo sucede com os currículos profissionais e as entrevistas. Quanto mais você se valorizar, mais confiança transmite à empresa.
Os valores do reino são opostos aos desse mundo. Você pode até se exaltar, mas será humilhado. E os que serão exaltados não são os humilhados, como muitas vezes pensamos; mas os que a si mesmos se humilham. Isto é um trabalho doloroso para a natureza humana soberba.
Os fariseus da época de Jesus estão sendo censurados por Cristo justamente por causa de sua autoexaltação. Desde a entrada triunfal em Jerusalém, todas as atitudes e palavras de Jesus e deles também demonstram que seus adversários são assim. Queriam destituir Jesus do título de “Filho de Davi” que os meninos clamavam (21.15,16); Jesus seca uma figueira sem fruto no caminho, para mostrar que Israel era infrutífero na mão desses religiosos (v. 19); os principais sacerdotes, por orgulho, tentam desautorizar Jesus por ter purificado o templo (vs. 23-27); Jesus lhes conta a parábola dos dois filhos para lhes mostrar seu orgulho (vs. 28-32); fala também da parábola dos lavradores maus (vs. 36-44); no cap. 22, mais uma parábola é contada para mostrar o orgulho deles por não aceitarem o convite para as bodas (22.1-14); Jesus humilha os fariseus e saduceus no caso da moeda e da ressurreição (vs. 15-33); os fariseus tentam humilhar Jesus com a pergunta sobre qual o maior mandamento da lei e Jesus responde sabiamente (vs. 34-40); finalmente, Jesus os humilha, fazendo uma pergunta sobre o senhorio do Messias diante de sua filiação ao rei Davi, a qual eles não conseguem responder (vs. 41-46).
Interessante no cap. 23 é que Jesus começa a mostrar que os escribas e fariseus usam até mesmo os aspectos piedosos da lei para se mostrarem santos, quando na verdade, usam essa piedade para demonstrar sua autoexaltação. Principalmente dos vs. 6-10, Jesus denuncia claramente as ações deles para receberem glória dos homens: amavam os primeiros lugares nos banquetes e as primeiras cadeiras nas sinagogas; amavam as saudações nas praças e o serem chamados de mestres; amavam ser chamados de pais pelos homens; amavam ser reconhecidos como guias dos homens. Mas Jesus desmantela sua arrogância e traz de volta esses títulos para Si mesmo e para Seu Pai que está nos céus. Somente Jesus é Mestre; somente Deus é Pai; e somente Jesus é o Guia! Será que Jesus estava Se contradizendo? Pois disse que o que a si mesmo se exaltasse seria humilhado... entretanto, Ele é Deus e, mesmo tendo Se humilhado, o Pai O exaltou (Fp 2.6-11)!
Precisamos entender que reconhecer as características de virtudes que existem em nós não é orgulho. A questão é colocar estas qualidades em evidência a fim de sermos vistos pelos homens (v. 5). No v. 6 Jesus diz que eles alargavam os filactérios e alongavam as franjas. Na lei não era proibido usar filactérios (tefilim) nem franjas (tsitsi no talit) – ver Dt 6.8; 22.12; Nm 15.38. Os tefilim e os tsitsi não eram largos nem longos. Deus os via e sabia se o coração do judeu religioso realmente guardava Sua lei ao andar com estes adereços. Mas eles aumentaram o tamanho deles para que os homens vissem. O senso de piedade que eles transpareciam aos homens é que revelava sua autoexaltação. Jamais eles aceitariam que isso fosse orgulho, pois estava travestido de piedade. Hoje também os louvores de si mesmos que muitos fazem mascaram-se com o nome de Deus, com a Bíblia e outros elementos sagrados, que lhes dão um tom de humildade, quando, na verdade, é um sacrilégio, por assim dizer, esconder a autoexaltação por trás de elementos sagrados.
Jesus diz que os tais serão humilhados. De fato, não há nada mais pernicioso na Bíblia do que o orgulho. Satanás é o primeiro exemplo disso, pois foi o primeiro ser que recebeu humilhação por punição, como paga por sua autoexaltação (Is 14.12-15). Ao tentar nossos primeiros pais no Éden, Satanás os vê recebendo a mesma humilhação da parte de Deus, ao serem expulsos do jardim (Gn 3.23). Tiago diz que aquele que se orgulha terá Deus como inimigo que marcha em sua direção para atropelar (Tg 4.6). E o apóstolo Pedro nos declara o mesmo em sua carta (1Pe 5.5). Ser humilhado pode significar duas coisas: ou Deus humilha o indivíduo para que em algum momento de sua vida ele venha a reconhecer a glória de Deus e seja salvo, ou a humilhação será o desprezo eterno no lago de fogo.
Por outro lado, Jesus diz que os que a si mesmos se humilham serão exaltados. Trata-se aqui não de ser humilhado pelos outros para ser honrado por Deus no futuro, como geralmente se diz. Antes, Jesus está falando de uma auto-humilhação. Ele Se refere a um desprezo de si, reconhecimento da nossa nulidade e vaidade. O que a si mesmo se humilha, não busca explicar sua miséria no pecado alheio. Não se justifica porque o outro também é pecador, antes se coloca como aquele publicano de Lc 18, como “o pecador”! Ele não se importa que outro pecador pense bem de si mesmo; isso não o incomoda. O publicano reconhecia sua miséria, mesmo que o fariseu não reconhecesse a sua. Os que se humilham a si mesmos não usam a preposição “mas”. Eles não dizem: “Eu sou realmente pecador, ‘mas’ fulano, ou ‘mas’ é por causa disso e daquilo”, etc. Não! Os que a si mesmos se humilham, mesmo que todos os demais homens falhos como ele afirmem que não são pecadores, eles ainda se veem os piores de todos.
Os que se humilham não buscam justificativas para seus pecados. Não culpam Adão, não culpam a mulher, não culpam o diabo, não culpam o destino nem mesmo o fatalismo. Antes, atribuem a si mesmos a sua falta. Reconhecem que são falidos, que pecam porque são isso mesmo, pecadores! Só uma frase lhes sai dos lábios: “Miserável homem que sou” (Rm 7.24)! Os que se humilham já tiveram um encontro com o terror da santidade de Deus, como Isaías e, como ele, já pronunciaram a sentença sobre si mesmos: “Ai de mim! Pois estou perdido; porque sou um homem de lábios impuros, e habito no meio de um povo de impuros lábios; os meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos”(Is 6.5). Jesus disse que os lábios pronunciam aquilo de que está cheio o coração (Mt 12.34b). Se nossos lábios são impuros é porque nosso coração é podre! Assim se enxerga o que se humilha! Perdido! Aterrorizado e sem esperança, condenado e sem Deus no mundo (Ef 2.12).
Jesus diz que esse tal será exaltado! Sim, bem-aventurado é o pobre, o falido, o miserável, o desgraçado de espírito (assim autorreconhecido), porque dele é o reino dos céus (Mt 5.3)! O primeiro degrau da exaltação de Deus é o reconhecimento de sua lástima! Não que esse reconhecimento seja uma autodepreciação, mas um reconhecimento da falência de agradar a Deus por quaisquer que sejam os meios ou as obras! Tem gente que se deprecia de tal modo, que outros chegam a ter dó e compaixão dela, concluindo que merece o céu, de tão humilde que ela é. Auto-humilhação não é o mesmo que autodepreciação. Podemos, aliás, nos orgulhar quando todos estão admirando nossa pretensa humildade! O reconhecimento da falência espiritual daquele que se humilha como Cristo está falando é tão grande, que ele não quer ser visto por ninguém. O publicano de Lc 18 orava de cabeça baixa, nem ousava levantar os olhos ao céu!
Ser exaltado, no entanto, não é como ouvimos em algumas pregações de nossos dias, ou em alguns cânticos que dizem que estaremos por cima de nossos inimigos, ou que aqueles que nos humilharam agora vão nos implorar clemência, essas coisas... ser exaltado é estar na posição de justificado. Jesus afirma que o publicano de Lc 18 voltou para casa justificado e não o fariseu. Ser exaltado é estar numa posição declarada inatacável pelo próprio Deus! Uma posição que jamais pode ser censurada por ninguém! Agora passamos a ser filhos de Deus e esta é a maior posição que alguém pode ter. Não nos referimos a glórias e bajulações humanas, mas ao fato de que não estamos mais em inimizade contra Aquele que nos condenaria e nos humilharia por toda eternidade no inferno!
Finalizo lembrando de que, geralmente os que a si mesmos se exaltam são os que revelam suas obras, seus grandes feitos diante dos olhos humanos, para se parecerem santos e agradáveis a Deus. Os que a si mesmos se humilham sabem que suas melhores obras não passam de trapo da imundícia (Is 64.6)! Eles dependem da obra de Cristo apenas. Os que se exaltam parecem crentes dignos e santos, mas depois serão envergonhados para sempre! Os que se humilham parecem pobres e bobos, mas serão exaltados eternamente junto com o Filho de Deus, seu Irmão mais velho!
Pr. Cleilson
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Teolatria. |
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