O evangelho não é, de maneira nenhuma, o que nós sugerimos. Eu, por minha vez, esperaria ter de me purificar para marcar uma audiência com um Deus Santo. Mas Jesus falou de Deus ignorando o mestre religioso que se achava fantástico e deu atenção a um pecador comum que rogava: "Ó Deus, tem misericórdia". Em toda a Bíblia, na verdade, Deus demonstra uma notável preferência por pessoas "autênticas" em vez de pessoas "boas". Nas palavras do próprio Jesus: "Haverá alegria no céu por um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento".
Em um de seus últimos atos antes de morrer, Jesus perdoou o ladrão que pendia de uma cruz, sabendo muito bem que o ladrão havia-se convertido por causa de puro medo. Esse ladrão nunca estudaria a Bíblia, nunca freqüentaria uma sinagoga ou igreja e nunca acertaria a sua vida com todos aqueles que havia prejudicado. Ele simplesmente disse: "Senhor, lembra-te de mim", e Jesus lhe prometeu: "Hoje estarás comigo no paraíso". Foi outro lembrete chocante de que a graça não depende do que fizemos por Deus, mas, antes, do que Deus fez por nós.
Pergunte às pessoas o que elas devem fazer para ir para o céu e a maioria vai responder: "Ser bom", "ser caridoso". As histórias de Jesus contradizem essa resposta. Tudo que devemos fazer é clamar: "Socorro!". Deus recebe em sua casa qualquer um que o fizer e, de fato, já deu o primeiro passo. Como Sören Kierkegaard disse:
"Quando se trata de um pecador Ele não fica simplesmente parado, com os braços abertos e dizendo: "Venha cã". Não. Ele fica ali e espera, como o pai do filho perdido esperou; ou melhor, ele não fica parado esperando: sai procurando, como o pastor procurou a ovelha perdida, como a mulher procurou a moeda perdida. Ele vai — não, Ele foi — infinitamente mais longe do que qualquer pastor ou qualquer mulher. Ele seguiu calmamente o longo e infinito caminho de ser Deus para se tornar homem e, desse modo, foi procurar os pecadores."
Quando penso em Deus, levanto a imagem do pai cego de amor que está a milhas de distância do monarca severo que eu costumava imaginar. Penso na descrição que Jesus fez do Pai que espera, sofredor, insultado, mas desejando mais do que tudo perdoar e começar tudo de novo, para anunciar alegremente: "Este meu filho estava morto, mas reviveu; estava perdido, e foi achado".
O Réquiem, de Mozart, contém uma frase maravilhosa que se transformou em minha oração, uma prece que faço com confiança cada vez maior: "Lembre-se, Jesus misericordioso, de que eu sou o motivo da sua viagem". Creio que Ele se lembra.
Philip Yancey, em "MARAVILHOSA GRAÇA"