29 setembro 2010

Serapião




 

SERAPIÃO

 

Serapião era um velho mendigo que perambulava pelas ruas da cidade.

 

Ao seu lado, o fiel escudeiro, um vira-lata que atendia pelo nome de  Malhado.

Serapião não pedia dinheiro.

 

Aceitava sempre um pão, uma banana, um pedaço de bolo ou um almoço feito  com sobras de comida dos mais abastados.

 

Quando suas  roupas estavam  imprestáveis, logo era socorrido por alguma alma  caridosa.

 

Mudava a  apresentação e era alvo de brincadeiras.

 

Serapião era  conhecido como um  homem bom, que perdera a razão, a família, os amigos e  até a identidade. Não bebia bebida alcoólica, estava sempre tranqüilo,mesmo quando não havia  recebido nem um pouco  de comida.

 

Dizia sempre que Deus  lhe daria um pouco  na hora certa e, sempre na hora que Deus determinava,  alguém lhe estendia uma porção de alimentos.

 

Serapião agradecia com  reverência e rogava a Deus pela pessoa que o ajudava.

 

Tudo que ganhava, dava primeiro para o malhado, que, paciente, comia e  ficava a esperar por mais um pouco.Não tinha onde  dormir, onde anoiteciam,  lá dormiam.

 

Quando chovia, procuravam abrigo embaixo da ponte e, ali o  mendigo ficava a meditar, com um olhar perdido no  horizonte.

 

Aquela figura me deixava sempre pensativo, pois eu não entendia aquela vida  vegetativa, sem progresso, sem esperança e sem um  futuro promissor.

 

Certo dia, com a desculpa de lhe oferecer umas bananas fui bater um papo  com o velho Serapião.

 

Iniciei a conversa falando do Malhado, perguntei pela idade dele, o que  Serapião, não sabia.

 Dizia não ter idéia, pois se  encontraram um certo dia quando ambos andavam pelas ruas e falou:

 

- Nossa amizade começou com um pedaço de pão, ele parecia estar faminto e eu  lhe ofereci um pouco do meu almoço e ele agradeceu,  abanando o rabo, e daí,  não me largou mais.

 

-Ele me ajuda muito e eu retribuo  essa ajuda sempre que  posso.

 

Curioso perguntei:

 

- Como vocês se ajudam?

 

- Ele me vigia quando estou dormindo; ninguém pode chegar perto que ele  late ataca.   

 

- Também quando ele dorme, eu fico vigiando para que outro  cachorro não o incomode.

 

Continuando a conversa, perguntei:

 

- Serapião, você tem algum desejo na vida? - Sim, respondeu ele - Tenho vontade de comer um cachorro quente, daqueles  que a Zezé vende ali na esquina.

 

- Só isso? Indaguei.

 

- É, no momento é só isso que eu desejo.

 

- Pois bem, vou satisfazer agora esse grande desejo.

 

 Saí e comprei um cachorro quente para o mendigo. Voltei e lhe entreguei.

 

Ele arregalou os olhos, deu um sorriso, agradeceu a dádiva e em seguida tirou a salsicha, deu para o Malhado, e comeu o pão com  os temperos.

 

Não entendi aquele gesto do mendigo, pois imaginava ser a salsicha o melhor pedaço, não contive e perguntei intrigado:

 

- Por que você deu para o Malhado, logo a salsicha?

 

 Ele com a boca cheia respondeu:

 

- Para o melhor amigo, o melhor pedaço!

 

E continuou comendo, alegre e satisfeito. 

 

Despedi-me do Serapião, passei a mão na cabeça do Malhado e sai pensando...

 

Aprendi como é bom ter amigos.

 

Pessoas em que possamos  confiar.

 

Por outro  lado, é bom ser amigo de alguém e ter a satisfação de ser reconhecido como  tal.

 

Jamais esquecerei a sabedoria daquele eremita:

 

"PARA O MELHOR AMIGO O MELHOR PEDAÇO  "

 

Você tem um grande pedaço no meu coração.

 

Abraço!!!!!!

 

 

 

 

 


 
Marco Aurélio
marcoaureliocicco.wordpress.com

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